Por Gabriel Augusto Pedrão, Crefito-3: 279964-F
Devido a pandemia de COVID-19 quase todas competições esportivas foram paralisadas. Com a melhora do surto em alguns países da Europa e com a flexibilização das medidas de quarentena, estão ocorrendo anúncios e debates sobre a possibilidade de retorno das atividades de algumas das principais ligas de futebol do continente. França e Holanda declararam o encerramento da temporada atual, Espanha e Inglaterra discutem um possível retorno, Portugal e alguns países do leste europeu anunciaram oficialmente sua volta para junho. Já a Alemanha, terá o reinício da temporada no dia 16 de maio para realização de 9 rodadas da Bundesliga e a finalização da copa da Alemanha (quartas de finais).
Há cerca de duas semanas o British Journal of Sports Medicine (BJSM) publicou um editorial1 com algumas recomendações e os principais fatores a serem considerados para um retorno seguro das atividades, tanto para atletas quanto para comissão técnica, árbitros e torcedores. Apesar do ponto central deste editorial ser as precauções quanto a contaminação e disseminação do vírus os autores orientam ainda que “os jogadores precisariam ter tempo para ganhar aptidão física antes da retomada das partidas”. O tempo entre a volta aos treinos e o reinício da competição após a quarentena na Alemanha, por exemplo, será de cerca de um mês. Então podemos traçar um paralelo entre esse tempo de preparação e a pré-temporada realizada anualmente pelos times já que, entre as temporadas, os clubes têm cerca de um mês de treinos até o início de uma nova temporada.
Um grupo de pesquisadores realizou em 2016 um estudo2, em conjunto com a UEFA, que investigou a associação do treino pré-temporada com o número de lesões durante a temporada, acompanhando por 15 anos os principais clubes europeus. Obtendo como resultado que um maior número de sessões de pré-temporada está estatisticamente associado a menos lesões graves, mais participações em treino e mais disponibilidade em partidas durante toda a temporada. Ou seja, uma boa pré-temporada pode diminuir o número de jogadores com lesões graves e participar de mais treinos durante a temporada, além de deixar mais jogadores à disposição da equipe técnica.
Outra pesquisa realizada pelo grupo de estudos sobre lesões da UEFA (2017) levou em consideração outro fator importante na preparação e controle de carga dos atletas. Estudo este que acompanhou 5 times participantes da Champions League e encontrou uma associação entre aumento semanal de carga (quando comparado com as 3 ou 4 últimas semanas) e as lesões sem contato (ou seja, lesões em que o atleta não tem contato do adversário ou de um colega). Isso quer dizer que, durante a temporada ou a pré-temporada, um aumento muito grande na intensidade do treino aumenta o risco deste atleta sofrer uma lesão sem contato. Um mapeamento de lesões realizado pela CBF em 2018 apresentou o estiramento muscular como a lesão mais presente no campeonato brasileiro, que é uma lesão que ocorre sem contato, geralmente após um lance de sprint (aceleração rápida em curta distância) ou de chute do atleta.
Mais um estudo realizado por este grupo chegou à conclusão de que não ter 4 jogadores disponíveis para um jogo (por lesões ou suspensões) pode aumentar a demanda física da equipe. Ao acompanhar as equipes da Champions League de 2014-2015 e 2015-2016 verificou-se que ao não ter esses jogadores disponíveis para a partida faz com que ocorra um aumento do número de sprints realizados pelos atletas em campo bem como um aumento na distância percorrida em alta velocidade. Isso mostra que a ausência de jogadores disponíveis para uma partida pode aumentar a demanda física dos jogadores em campo, podendo assim levar ao aumento da chance destes se lesionarem.
Estes fatores trazem à tona os desafios para a equipe médica e técnica dos times que estão retornando às atividades após a pausa causada pelo COVID 19. Faz-se necessário realizar uma “pré-temporada” de boa qualidade com controle de carga bem inspecionado para se minimizar os riscos de lesão
Referências
- Carmody S, Murray A, Borodina M, Gouttebarge V, Massey A. When can professional sport recommence safely during the COVID-19 pandemic? Risk assessment and factors to consider [published online ahead of print, 2020 May 7]. Br J Sports Med. 2020; bjsports-2020-102539. Doi:10.1136/bjsports-2020-102539
- McCall A, Dupont G, Ekstrand J. Internal workload and non-contact injury: a one-season study of five teams from the UEFA Elite Club Injury Study. Br J Sports Med. 2018;52(23):1517‐1522. doi:10.1136/bjsports-2017-098473
- Windt J, Ekstrand J, Khan KM, McCall A, Zumbo BD. Does player unavailability affect football teams’ match physical outputs? A two-season study of the UEFA champions league. J Sci Med Sport. 2018;21(5):525‐532. Doi: 10.1016/j.jsams.2017.08.007
- Ekstrand J, Spreco A, Windt J, Khan KM. Are Elite Soccer Teams’ Preseason Training Sessions Associated with Fewer In-Season Injuries? A 15-Year Analysis from the Union of European Football Associations (UEFA) Elite Club Injury Study. Am J Sports Med. 2020;48(3):723‐729. Doi:10.1177/0363546519899359